Artigo: Novo desenho?
Por Rui Medeiros
As eleições municipais batem à porta. Embora tenham sido adiadas para novembro, há sensação de que já estão em cima da hora.
Elas ocorrerão diante de um quadro diferente daquele que dominou o momento das eleições presidenciais, não apenas por que é outro ano e as realidades locais sejam o tema, embora forças sociais e partidos sofram pesadamente a influência de fatores de importância geral, como a onda antiesquerda (mais que antipetista) que dominou aquelas eleições para Presidente da República.
Trata-se da mesma sociedade e estão presentes os mesmos partidos e grupamentos. Por certo, também está presente a mesma polarização, mas o núcleo de um de seus polos encontra-se contaminado com a visível incompetência que demonstra na condução do país.
A crise que andava em curso, agudizada a seguir pela pandemia da Covid 19, deixou escancarados os malefícios da estrutura social perversa. Vê-se que não se trata de falar só da criminosa distribuição da renda nacional, em que dez por cento dos mais ricos concentram quase inteiramente cinquenta por cento dela. Ficou revelado às escâncaras um contingente de desamparados cujos rostos e nomes aparecem em extensas filas de pessoas que necessitam receber minguada importância inferior a um salário mínimo para sobreviver (o ministro da fazenda em confissão de que não conhece a sociedade brasileira, ou faz exercício de cinismo, disse que a demanda pelo minguado auxílio mostrou um Brasil invisível!). Vê-se contingente de microempresários aos choros, de joelho diante de governantes, a pedir a reabertura de seus estabelecimentos. Em diversos lugares há o colapso ou quase colapso do serviço de saúde, em suas faces pública e privada. Pequenos negócios são inviabilizados.
Agora, o discurso econômico neoliberal sofre os golpes da realidade. Ou se atende parte da demanda social, ou é a revolta social desorganizada e a ampliação da atividade criminosa. Há não apenas choros abertos ou latentes, mas vontade imensa de contestar.
A direita extremada (nela o Presidente da República e seus ministros) sofre o golpe do descrédito. Não se evitou a prisão, inquérito e processo contra barulhentos apoiadores fascistas do Presidente da República e vão ficando claros, como se exposto numa tela panorâmica bem iluminada, os métodos com que as eleições foram ganhas: do disparo, por robôs, de Fake News, ao apoio de milicianos e abuso de poder econômico. Inviabilizada a transformação de um partido de aluguel (PSL) em partido nuclear da base de apoio parlamentar, círculos do poder não conseguiram formar seu partido (Aliança pelo Brasil), cujas demarches para obtenção de apoiadores foram marcadas pelo fracasso. Há fortes desconfiança, mesmo entre apoiadores do governo federal, na competência do ministro da fazenda e em seu plano (que plano mesmo?).
A direita, antes reunida, desune-se, às vezes com uso de discurso cheio de ódio, e moralismo como arma política, demonstrou esbarrar na revelação da imoralidade das Fake News (de que ela tanto se utilizou), no silêncio de seu líder diante da investigação de seus financiadores e dos crimes de parentes, e amigos do Presidente da República. Agora, mais um golpe: o afastamento do DEM e MDB do alinhamento automático ao Presidente da República e dificuldades para o Centrão.
É evidente que há forte resíduo do amplo discurso contra a esquerda institucionalizada (ou não institucionalizada), mas pode-se prever a ampliação de vozes dispostas a demonstrar quem realmente é o grupo de poder e quem são seus financiadores. Nesse sentido fica esgarçado o discurso contra partidos adversários. Fica esgarçado o discurso bolsonarista e de seus adeptos e abre-se a possibilidade de rearranjos dentro dos partidos oposicionistas (mesmo à revelia de dirigentes), envolvendo inclusive (em alguns Estados e Municípios) o PT, partido que saiu mais golpeado diante da avassaladora onda de denúncias e processos da Operação Lavajato e seus desdobramentos, inclusive a prisão de sua liderança maior.
Resta saber se ainda há a mesma desenvoltura dos partidos adversários do PT, pois esses mesmos já estão com seus problemas: o núcleo do Presidente da República acossado com inquérito no STF, ação no TSE, CPI das Fake News, inquéritos e ações contra amigos e familiares do chefe, pressão da imprensa, por exemplo, não tem jeito nenhum (como pensavam incautos eleitores) e aparência de pudicas noviças de convento ou intérpretes neopentecostais da Bíblia em defesa da moral, da família e dos bons costumes. O Chefe do grupo demonstra que não tem as credenciais que dizia ter. Mesmo falar mal de uma parte de congressistas fisiológicos (centrão) ficou difícil. Afinal, agora são sócios, ou condôminos.
Na cena que se vai desenhando, o PT, que não encontrou ainda o discursos-proposta para fazer oposição, está diante de adversários que, igualmente não têm discurso consistente ou que ora alteram suas falas atabalhoadamente, ora repisam o discurso para isolamento do PT da sociedade e de outros partidos. É como se estivessem tomados pela incerteza. Os partidos com experiência de poder têm seus principais líderes sub judice: Alkmin, Aécio e Serra no PSDB (partido já quase completamente ocupado pelo Governador Dórea, que o joga para a direita que pretende ser alternativa a Bolsonaro), e o MDB contenta-se com migalhas e também tem lideranças sub judice.
Diante das próximas eleições, apesar do racha da direita, especialmente setores que marcharam com Bolsonaro, dos fracassos e da falta de rumo, o Capitão Presidente ainda tem seus barulhentos e rígidos quinze por cento de aliados fiéis. Tudo indica que já não tem o vigor do momento das últimas eleições presidenciais, embora possa ocorrer eventual oscilação favorável do índice de sua popularidade, em razão da utilização de verbas destinadas a pessoas desamparadas (ou que ficaram mais desamparadas) por força da pandemia reinante. Ele já não aglutina os setores mais à direita. Mingou bastante do ponto de vista do apoio de grupos organizados, embora esteja colocando em pauta as proposições de vários desses. Precocemente (em relação a 1922), DEM e PSDB se aproximam para aliança, na direita, alternativa a Bolsonaro.
Em Vitória da Conquista, o PT continua forte, apesar da onda antiesquerda. Seu problema é ele mesmo: reaprender como ser oposição, avaliar de forma pública e corajosa os fatos que marcaram sua trajetória, positivos e negativos, e ida de suas lideranças aos tribunais na condição de rés, formular propostas sobretudo para a saída da crise, e exigir também ele, a avaliar política dos outros partidos quanto a seus membros sub judice e a seu apoio à escalada de Bolsonaro.
Quanto às candidaturas, em Vitória da Conquista o que se sabe é que José Raimundo, ex-Prefeito, será o candidato. Na situação atual, o partido realizará coligação, ou coligações. O embate exige a experiência dos partidos; essa conta mais que candidaturas de líderes de setores, supostamente puxadores de votos, no momento atual. Cabe ao(s) aliados buscarem os votos com a sua experiência. O embate atual não se contenta com “representantes” disso ou daquilo, necessita de definições partidárias, refazimento de alianças. No atual quadro, desponta como aliado, capaz de indicar o candidato a vice-Prefeito, o PCdoB que tem disponível o nome do Vereador Andreson, certamente uma voz atuante no partido e com inserção elogiada na Comunidade. É o que se sabe, mas isso não exclui apoio já indispensável do PSB que já tem quadros que militam desde novos na política local. Parece-me que o processo está assim sinalizando.
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