Homem na Lua: há 50 anos, a Apollo 11 era lançada rumo ao satélite da Terra
Há 50 anos, partia da Flórida a missão que mudou a forma como olhamos para o Universo. Desde que o homem pisou em solo lunar, seguimos desbravando o espaço, impulsionados pelos avanços tecnológicos e pela curiosidade de descobrir o que existe além da Terra
Era 16 de julho de 1969. As rádios norte-americanas tocavam sem parar o hit Sugar, sugar, dos Archies; a expectativa do Festival de Woodstock estava no imaginário dos jovens que participariam do lendário evento dali a um mês. No Brasil, os jornais noticiavam que a ditadura militar estudava extinguir o Senado. Já na Inglaterra, David Bowie lançava o LP Space Oddity para coincidir com um fato que mudaria para sempre a relação do homem com o Universo: às 10h32 (horário de Brasília), três homens partiriam da Flórida para conquistar a Lua.
Ao entrar na Apollo 11 um ano antes da invenção dos microcomputadores, Michael Collins, Buzz Aldrin e Neil Armstrong realizavam um sonho que sempre acompanhou a humanidade. Desbravar o espaço, ultrapassar os limites da Terra e até, quem sabe, dar de cara com alguma forma de vida eram desejos antigos, expressos em diversas culturas do Ocidente e do Oriente. Mais próximo objeto extraterrestre, a Lua exercia um fascínio especial — praticamente todas as sociedades têm mitologias associadas a ela.
Curiosamente, o século 20 não começou tão atento ao satélite. “Naquela época, os astrônomos estavam interessados apenas em objetos fora do nosso Sistema Solar. Eles viam a Lua como uma amolação que iluminava o céu noturno, dificultando o estudo das estrelas e galáxias mais fracas”, contou, por meio da assessoria de imprensa do Instituto de Ciência Planetária, em Tucson, William Hartmann. O astrônomo e divulgador científico foi um dos primeiros alunos de pós-graduação do célebre cientista norte-americano Gerard Kuiper, considerado o pai da ciência planetária moderna.
Ao contrário da maioria dos astrônomos da época, o grupo liderado por Kuiper na Universidade do Arizona não só se interessava pela Lua como produziu, a partir de fotos, os primeiros atlas lunares. Essas publicações ajudaram a Agência Espacial Norte-Americana (Nasa) a compreender a geologia do satélite e a escolher os melhores locais para as sondas e, futuramente, os homens pousarem nas missões Apollo.
Guerra fria
Naquele fim de década, o espaço já não era algo tão novo para o homem. Oito anos antes, o cosmonauta russo Yuri Garagin tomava para si o título de primeiro homem a sair da Terra. Em plena Guerra Fria, os Estados Unidos não podiam, é claro, ficar para trás. A corrida espacial começou, oficialmente, em 4 de outubro de 1957, quando a ex-União Soviética lançou o Sputnik 1, levando a Nasa a, freneticamente, desenhar um programa muito mais ousado.
Os norte-americanos não apenas ultrapassariam a fronteira terrestre, mas deixariam pegadas na Lua. “Enviar uma missão tripulada era muito mais pelo glamour do que pela validade científica”, explica o astrônomo Naelton Mendes de Araújo, do Planetário do Rio de Janeiro. “As sondas automatizadas são muito mais rápidas, seguras e baratas. Por isso, o voo tripulado foi muito mais por política que por ciência.”
Antes de enviar Collins, Aldrin e Armstrong para a Lua, a Nasa preparou três missões não tripuladas: Ranger, Surveyor e Lunar Orbiter. Entre 1961 e 1965, nove sondas Ranger foram lançadas. A primeira bem-sucedida foi a 7, que partiu em 28 de julho de 1964, pousou na planície Mare Congitum, ao sul da cratera Copernicus, e, de lá, mandou mais de 4,3 mil fotos para a Terra.
Em fevereiro do ano seguinte, a Ranger 8 alunissou no mesmo lugar que os astronautas da Apollo 11 deixariam suas pegadas: o Mar da Tranquilidade. A última nave Ranger foi lançada em março de 1965 e enviou 5,8 mil novas imagens desde a cratera Alphonsus. Trabalhadas na Universidade do Arizona, essas fotografias foram a base dos atlas produzidos pela equipe de Gerard Kuiper.
Entre 1966 e 1968, cinco de sete missões Surveyor foram bem-sucedidas e, além de mais de 90 mil fotos, realizaram experimentos, examinaram o solo lunar abaixo da superfície e identificaram a composição mineral de alguns pontos da Lua. Uma das principais descobertas — por sinal, muito mais importante do ponto de vista científico do que qualquer realização da Apollo 11 — foi a existência de basalto, indicando que, no início da história do satélite, a formação das grandes crateras levou ao derretimento de material do interior da Lua, o que deflagrou violentos vulcanismos.
O mapeamento completo do satélite, um passo essencial para enviar uma missão tripulada, ocorreria com a Lunar Orbiter, que, entre 1966 e 1967, investigou detalhadamente a topografia e a geologia de diversos tipos de terrenos lunares com objetivo de encontrar o local mais apto para a alunissagem da Apollo. Com tantas informações nas mãos, a Nasa marcou a data de lançamento da esperada ida do homem à Lua. Assim, há 50 anos, Michael Collins, Buzz Aldrin e Neil Armstrong davam o primeiro “grande salto para a humanidade”.
Duas perguntas para
E agora há mesmo necessidade de uma nova missão?(foto: arquivo pessoal )
E agora há mesmo necessidade de uma nova missão?(foto: arquivo pessoal )
Antonio Pedro Timoszcz, membro sênior do Instituto de Engenheiros
Eletricistas e Eletrônicos (IEEE) e especialista em engenharia de sistemas
A Nasa foi muito ousada ao mandar uma missão tripulada à Lua em 1969?
É importante a gente ter em mente o contexto da época em que isso aconteceu. Já no fim dos anos 1950 e início dos anos 1960, a guerra fria dos Estados Unidos com a antiga União Soviética estava em curso. O que aconteceu foi que, de repente, os russos começaram a progredir muito em relação a essa questão espacial. Eles foram os primeiros a colocar um satélite em órbita, o Sputnik, e, quando os americanos se preparavam para colocar os satélites deles, os russos enviaram o astronauta Yuri Gagarin, provocando uma certa surpresa nos Estados Unidos. Então, os EUA, como uma forma de reagir a essa perda de liderança na questão da tecnologia espacial, colocaram como objetivo do país ir à Lua. Realmente, em termos de tecnologia, estava se aprendendo muito à época, mas, notadamente, esse objetivo fez com que diversas dificuldades tecnológicas fossem superadas, tivéssemos um grande desenvolvimento na área de engenharia, de materiais, tudo que serviu de suporte para que viabilizasse essas missões. Lembrando que a Apollo 11 foi a concretização de um objetivo, mas, até ela, várias outras missões aconteceram. Foi uma sucessão de progressos, e as dificuldades tecnológicas foram sendo superadas. O desafio é o que faz que se supere os obstáculos e que se produza novas tecnologias, o que chamamos de inovação.
E agora há mesmo necessidade de uma nova missão?
É claro que isso permitiu avançar o conhecimento em termos da Lua, do espaço, das condições de vida no espaço, o que permitiu desenvolver os ônibus espaciais, a Estação Espacial Internacional. Mas o que classifico como algo muito interessante é o transbordamento dessa tecnologia toda que foi desenvolvida para o programa espacial para nossa vida do dia a dia. Essa transferência de tecnologia que aconteceu talvez tenha sido o ponto mais marcante em termos de benefícios para a sociedade. Só para citar alguns exemplos, os tênis que usamos hoje em dia vieram das botas que foram feitas para os astronautas. As lentes resistentes dos óculos vieram do fato de se precisar ter visores resistentes à poeira, que não riscassem nem arranhassem. A espuma que é usada nos travesseiros evoluiu a partir da que foi usada nos assentos e em várias partes das naves para diminuir o impacto durante o pouso. A própria computação passou por um avanço muito grande pela necessidade de ter equipamentos que fizessem cálculos mais rápidos e precisos. Então, o ponto mais interessante é que todo esse programa espacial produziu como resultado lateral uma série de benefícios que está no dia a dia de todas as pessoas.
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